terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O poder do diálogo [resenha]


Ao pegar um livro, muitas vezes, pode nos parecer clichê nos perguntar o motivo da escolha e sempre nos vem à mente: gostei da capa, ouvi falar muito bem ou o autor é o badalado do momento.

Acredito fortemente que a influência para a escolha de um título seja o convívio com outras pessoas, com os mesmos gostos ou não. É nesse sentido que posso me referir, mesmo não me aprofundando no assunto, à literatura religiosa que vem conquistando estantes ultimamente.

Em uma das conversas de trabalho, eis que surge uma pauta interessante sobre literatura: o tema religioso dentro do texto literário pode ser polêmico? Todos nós sabemos que a literatura, na criação de mundos ficcionais, consegue nos levar a estados não imaginados pela racionalidade humana... e a religião? que papel ela consegue fazer neste percurso?

São essas as questões que me consumiram na leitura de O discípulo da madrugada, de Pe. Fábio de Melo. Confesso que esperava mais do livro, já que tinha lido uma obra do autor e tinha gostado por abordar um tema pelo qual eu estava passando naquele momento...mas isso é assunto para outro post.

O enredo gira em torno de um homem que se tornou amigo de Jesus e que o acompanhou boa parte de sua vida. No entanto, ao acompanhar seus últimos dias, esse protagonista sem nome – propositalmente, creio eu – não assumiu a amizade e o bem que Jesus lhe fez ao longo de suas intermináveis conversas pela madrugada afora.

Até este ponto da história encarei o protagonista com olhos de uma maldade sem fim, entendendo ser ele um dos opositores da doutrina cristã. O que me surpreendeu foi que, conhecendo mais de perto este personagem, constatei que a influência dos outros sobre seus pontos de vista era muito grande. Na verdade era uma pessoa extremamente fragilizada e com alguns nós pessoais ainda por resolver.

Não adiantando os fatos do enredo, em certo ponto da narrativa, o personagem – também narrador – toma uma atitude frente aos acontecimentos de sua vida e relembra, com extrema nostalgia, os diálogos e as conversas que teve com Jesus. Os pontos abordados pelo autor tocam em questões relativas à imagem de Deus na cultura dos homens, o valor e o verdadeiro sentido da fé cristã e da vida de certa forma.

Por esse breve resumo, percebemos a profundidade religiosa e filosófica colocada pelo autor. Não poderia ser diferente, já que o autor tem uma formação eclesiástica que dialoga diretamente com o modo de pensar teológico e cristão, logicamente. O único ponto que gostaria que fosse um pouco mais claro é a linguagem. Existem capítulos – curtos e densos – que se preocupam mais em explicar a base filosófica do desenvolvimento do personagem do que o enredo. É claro que isso pode ser uma característica de estilo do autor e sua formação, já mencionada, serve como um contexto de influência sobre seu modo de escrever.

O que gostaria de enfatizar é a prática do diálogo como fonte de conhecimento inesgotável e que foi, como nos relata o discurso religioso, a forma escolhida por Jesus para lançar as bases da doutrina cristã. Prova cabal de que a literatura está presente na religião são as parábolas. São histórias bem curtas e populares da época que, provenientes de uma cultura oral, conseguiram passar a moral cristã.

Os leitores que se interessam por temas religiosos e que não se apegam a clichês e frases prontas, com certeza irão se reconhecer na construção de um texto, por vezes, simples na construção de personagem e a ambientação da narrativa. Porém, profundo na abordagem de temas que tocam a humanidade na sua mais densa camada de sentido.

Título: O discípulo da madrugada
Autor: Padre Fábio de Melo
Editora: Planeta
Páginas: 182


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