Não é novidade que a vida é feita a partir de um conjunto de pontos de vista. Afinal, o que vivo hoje – neste momento – é uma perspectiva que somente eu tenho sobre o que estou vivendo e sentindo. Com outra pessoa é diferente. Ela está em outro lugar, com outras pessoas, sentindo e vivendo momentos diferentes, mas, por ironia do destino (?), elas podem se encontrar.
Essa
foi a premissa de Apaguem
as luzes,
de Daniel Lucindo. O jovem autor, em seu romance de estreia, consegue
formar um quadro sobre a vida de diversas pessoas motivadas por uma
viagem aérea de Lisboa até Nice, uma cidade da França. O grande
movimento do vôo é justificado pelo interesse de quase todos em
assistir ao festival de música de Mônaco no dia seguinte.
Por
todo o romance sabemos sobre os fatos que acometeram as pessoas no
dia em que estavam prestes a embarcar no vôo com destino à cidade
francesa. Assim, conhecemos o ataque de ciúmes da esposa do piloto
devido à carona para uma comissária quase desempregada, o encontro
de um casal dentro do aeroporto, a complicada vida de uma banda de
rock que irá se apresentar no festival, o reencontro de antigos
amigos, enfim todo o histórico vivido por essas pessoas que irão se
encontrar naquele vôo.
A
partir deste esquema o romance ganha contornos de ação e mistério,
já que um dos protagonistas – Nuno – é atropelado pelo piloto
ao chegar ao aeroporto e, misteriosamente, tem uma visão, uma
espécie de aviso de Deus de que aquele vôo não poderá decolar.
Uma
característica de estilo do autor é o modo de construção de
personagens bastante trabalhado nas situações em que a mudança de
trajes e nomes se faz necessária. Não adiantando os fatos finais do
enredo, existe um personagem criminoso que consegue se esquivar de
sua punição através de um disfarce muito bem planejado e que, por
incrível que pareça, também consegue nos enganar.
Esse
personagem será o motim para que Nuno e seu amigo Paulo sejam
motivados a realizar uma séria perseguição com tom policial que
desemboca em um final não muito previsível.
Embora
o romance tenha uma estrutura de enredo bastante planejada no que se
refere à construção das personagens, sua ordem de entrada na trama
e o entrelaçamento de situações nos momentos que antecedem o vôo,
a desenvoltura do texto poderia ser um pouco mais acelerada. Acredito
que o tom de mistério da narrativa poderia ser colocado de uma forma
mais imposta – não clichê – mas ajustada e colocada mais à
frente de uma expectativa do leitor. É claro que isso não
descaracteriza a arquitetura do texto como um mosaico de vidas que se
cruzam e se embatem durante a narrativa.
A ida ao aeroporto, com seus percalços e situações vividas por
cada um, consegue perfazer o sentido de uma metáfora para a vida
como um conjunto heterogêneo de situações que se imbricam e se
caracterizam por elas mesmas.
É
nesse sentido que indico este livro àqueles que se interessam por
questões que envolvem os disfarces e as diferentes faces que a vida
nos propõe a representar, como uma tentativa de intervenção humana
dentro do complexo que a vida nos apresenta.
Título:
Apaguem as luzes
Autor: Daniel Lucindo
Editora:
Chiado
Páginas:
490
Editora Parceira
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